"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

outubro 27, 2012

LA DOLCE VITA DEL "PUDÊ" : A fatura milionária dos jetons


Ministros recebem R$ 1,1 milhão por ano com os extras pagos por estatais. 
AGU anuncia que vai recorrer na semana que vem contra a decisão que proíbe o pagamento aos ocupantes do primeiro escalão da Esplanada 

Denunciados em uma ação popular por acumular cargos no governo federal com funções consultivas em empresas estatais e privadas e receber acima do teto constitucional, os 11 ministros citados no processo na Justiça Federal de Passo Fundo (RS) que resultou na suspensão do pagamento dos jetons na última quinta-feira ganham, juntos, mais de R$ 1,1 milhão por ano. 

O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, é o que embolsa o maior valor. Ele é o presidente do Conselho de Administração do BNDES. Além dos R$ 26,7 mil recebidos mensalmente pela chefia da pasta em Brasília — teto do funcionalismo público brasileiro —, ele garante mais R$ 18 mil do banco. 

A Advocacia-Geral da União (AGU) deve recorrer da liminar na próxima semana.

O Ministério Público Federal (MPF), que também foi ouvido no processo judicial na cidade gaúcha, é contrário ao acúmulo de cargos em que a soma das remunerações ultrapassa o teto previsto constitucionalmente. Para o MPF, a atuação dos ministros nos conselhos consultivos é usada como artifício com a finalidade de proporcionar remuneração acima do permitido para integrantes do alto escalão do governo. 

“Não são necessárias maiores digressões para concluir pela imoralidade da utilização do pagamento de jetons para burlar a norma constitucional”, afirmou o órgão em parecer.

Responsabilidade

A AGU, que defendeu a União no caso e apresentará o recurso na próxima semana, acredita na legitimidade do exercício concomitante dos cargos. “A retribuição pelo exercício de função em conselho de entidade de direito privado guarda um caráter próprio, correspondente à retribuição de representação”, argumentou. 

O ministro da AGU, Luís Inácio Adams, é o quarto na lista dos ministros que mais recebem jetons. Ele participa de dois colegiados na Brasilprev e na Brasilcap.

Antes dele, na conta dos mais contemplados, estão os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento), integrantes de dois conselhos na Petrobras. Cada um recebe R$ 16,5 mil. 

Mantega é o presidente do Conselho de Administração da estatal, que conta ainda com a presença do empresário Jorge Gerdau e de Luciano Coutinho, presidente do BNDES. 

O ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, aparece no último lugar da fila: recebe R$ 1,8 mil por participar da Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba).

Para o consultor econômico Raul Velloso, é preciso saber se o ocupante de um conselho é mera figura decorativa ou se ele de fato exerce aquilo que está previsto legalmente no colegiado.

 “Na minha experiência de 20 anos atrás no serviço público, quando estava no governo, eu tinha a sensação de que os jetons eram meros complementos salariais, porque as pessoas, em sua maioria, não interferiam na administração daquela empresa. Nos conselhos, há responsabilidades e funções a serem exercidas”, afirma. 


Em toda a administração pública, o número de servidores que recebe jetons chega a 408. A minoria deles participa de mais de um conselho.

408 Total de servidores públicos que recebem jetons, segundo dados do Portal da Transparência

No topo

Confira a lista dos ministros que mais recebem jetons por participação em conselhos de empresas estatais e privadas

Ministro  Valor dos jetons Empresa

Fernando Pimentel (Desenvolvimento) R$ 18 mil BNDES

Guido Mantega (Fazenda) R$ 16,5 mil Petrobras

Miriam Belchior (Planejamento) R$ 16,5 mil Petrobras

Luís Inácio Adams (AGU) R$ 13,2mil Brasilprev e Brasilcap

Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) R$ 8,1 mil Sesc

Fonte: Portal da Transparência

LEANDRO KLEBER/Correio

O voluntarismo de Barbosa

As críticas do relator Joaquim Barbosa ao sistema penal brasileiro, feitas no ardor de uma das muitas discussões com o revisor Ricardo Lewandowski, explicam seu empenho em dar penas mais pesadas aos réus, tratando cada crime separadamente, sem a preocupação de calcular a pena como um todo, no dizer do revisor.

Lewandowski alega que vê "a floresta inteira" enquanto Barbosa "olha apenas uma árvore", dizendo que o relator não tem uma visão holística das condenações. Ao contrário, tudo indica que é a preocupação com a pena total que leva o ministro Barbosa a ter o máximo rigor com cada um dos crimes.

Ele estaria, ao cuidar de cada árvore separadamente, querendo preservar a floresta como objetivo final.

Quando Barbosa disse que, ao dar uma pena mínima para Marcos Valério em certo crime, o revisor estava "barateando" a punição, pois o réu não passaria mais que seis meses na cadeia, estava sofismando, como afirmou Lewandowski, mas tinha o objetivo de manter Valério o maior tempo possível na cadeia em regime fechado, evitando as brechas que o sistema penal brasileiro, que ele, o "New York Times" e boa parte da opinião pública brasileira consideram "risível", proporciona aos condenados.

A mesma coisa pode-se dizer quando Barbosa ironizou o pedido do advogado de Ramon Hollerbach, sócio de Valério, para que fosse levado em conta o voto do ex-ministro Cezar Peluso, que dera pena mínima a ele na lavagem de dinheiro. Barbosa sugeriu que a pena mínima faria com que o crime prescrevesse, e vários ministros reagiram afirmando que esse fato não tinha a menor importância e não deveria ser levado em conta na hora de determinar a duração da pena.

Acontece que pela legislação brasileira, após o cumprimento de 1/6 da pena, o condenado a mais de oito anos pode pedir a passagem do regime fechado para o semiaberto. Embora a pena máxima a ser cumprida seja de 30 anos, o que conta para o cálculo da progressão é o somatório (e não somatória como muitos juízes dizem e eu escrevi aqui outro dia) das penas.

Logo, se a pena de Valério for de 40 anos, somente depois de cumprir a pena em regime fechado por seis anos e seis meses, ele poderá tentar a mudança para o regime semiaberto.

No raciocínio de Barbosa, se os ministros levarem em conta a pena máxima de 30 anos e passarem a condenar os réus a penas mais baixas para não ultrapassar esse teto, na prática estarão permitindo que condenados por crimes gravíssimos sejam postos fora da cadeia em pouco tempo.

Na sua luta contra a impunidade, é certo, porém, que Barbosa, ao declarar-se contrário ao sistema penal brasileiro em fala que sabia estar sendo transmitida pela TV, não contribuiu para o fortalecimento institucional do país. Ao contrário, pôs a opinião pública mais insegura diante da ordem jurídica, logo ele, que hoje é tido como referência ética da nação e em breve estará presidindo o STF, justamente a mais alta instância dessa Justiça que ele critica.

Quando fez essa crítica, Barbosa citou o "New York Times" e deu-se conta de que mexera com "os brios ultranacionalistas" de alguns colegas, que na mesma hora disseram que vivemos no Brasil, temos que nos ater às nossas leis.

Dias Toffolli ressaltou que nos Estados Unidos há pena de morte, o que não ocorre no Brasil. E Celso de Mello lembrou que a Noruega condenara a apenas 20 anos o homem que assassinara várias pessoas recentemente.

Barbosa teve que explicitar seu ponto de vista, dizendo que era brasileiro, gostava do Brasil e que estava lutando justamente para melhorar a legislação. Mas não vai se livrar de críticas a seu voluntarismo por parte dos advogados dos reús, que se preparam para, nos embargos, acusá-lo de ter atuado com o intuito de condenar os réus.

Quando ele critica nosso sistema penal e se põe claramente a favor de penas mais duras, dá margem a que acusados vejam nele um carrasco e não um juiz.
Paralelamente, cresce na opinião pública a percepção de que Barbosa é um juiz em busca da Justiça.

Resta acompanhar para ver qual será a influência da presidência de Barbosa sobre o STF, pois, ao contrário dos Estados Unidos, onde o presidente da Suprema Corte atua como mediador entre as correntes e tem cargo vitalício, o presidente do STF tem o poder de induzir a pauta, lá e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que preside também.

Merval Pereira