"Um povo livre sabe que é responsável pelos atos do seu governo. A vida pública de uma nação não é um simples espelho do povo. Deve ser o fórum de sua autoeducação política. Um povo que pretenda ser livre não pode jamais permanecer complacente face a erros e falhas. Impõe-se a recíproca autoeducação de governantes e governados. Em meio a todas as mudanças, mantém-se uma constante: a obrigação de criar e conservar uma vida penetrada de liberdade política."

Karl Jaspers

julho 25, 2011

"FISCAL" DO DINHEIRO : SAL.CR$25MIL/APOS.INTEGRAL/FÉRIAS 2 MESES/ANO/CARRO OFICIAL/COTA PASS.CR$50MIL/ANO...

Nunca um cargo de fiscal do dinheiro público foi tão disputado como a vaga do ministro Ubiratan Aguiar no Tribunal de Contas da União.

O ex-presidente do TCU deixa a função compulsoriamente ao completar 70 anos, no segundo semestre.

Mas, desde já, pelo menos dez deputados da base governista se digladiam para sentar em sua cadeira. E o que atrai não são bem as pilhas de planilhas de gastos e projetos técnicos de obras públicas, mas o emprego vitalício, com salário de R$25 mil, aposentadoria integral, férias de dois meses por ano, carro oficial, cota de passagens de cerca de R$50 mil por ano e assessoria do mais completo corpo técnico da República.


Pela Constituição, os nove ministros do TCU devem ter idoneidade moral, reputação ilibada e notório saber jurídico e técnico para exercer o cargo, com experiência de no mínimo dez anos nessa área.

A vaga de Ubiratan Aguiar, ex-deputado pelo PSDB do Ceará, é, por direito, preenchida por um escolhido pela Câmara dos Deputados.


- Só na base governista há dez candidatos disputando a vaga. A oposição não deve apresentar candidatos - diz o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP).

Apenas deputados de base governista estão na briga

Desses dez candidatos, é a deputada Ana Arraes (PSB-PE), filha do lendário Miguel Arraes e mãe do governador Eduardo Campos (PE), quem sai na frente. Além do peso do filho cabo eleitoral, seus aliados dizem que ela é a preferida da presidente Dilma Rousseff, inclusive por sua proximidade com Eduardo Campos.

- O governador Eduardo Campos nem está articulando muito, não. A deputada Ana Arraes é a favorita. Já chega na disputa bem credenciada para o cargo. Filha de quem é, e mãe de quem é... - diz um dos aliados da deputada pernambucana.

No páreo, estão também os deputados Sérgio Carneiro (PT-BA), que tem apoio da bancada petista;
Osmar Serraglio (PMDB-PR);

Jovair Arantes(GO), líder do PTB;
Fátima Pelaes (PMDB);
Átila Lins (PMDB);
Damião Feliciano (PDT-PB);
Milton Monti (PR-SP)
e José Rocha (PR-BA).
Aldo Rebelo (PCdoB-SP) teria retirado seu nome.


- Vamos reunir a bancada até o dia 15 de agosto e o mais votado entre os três do PMDB será o nome do partido. Depois, os líderes da base vão resolver quem vai para a votação no plenário - diz o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN).

O líder do PT na Câmara, deputado Paulo Teixeira (SP), disse que a base tentará encontrar um nome de consenso para a vaga do TCU.

VALE-TUDO IDEOLÓGICO.

Entidades com longa história de vigilância sobre governos, como a UNE, se mantêm em silêncio diante da enxurrada de casos de corrupção ocorridos desde 2003, quando Lula assumiu o primeiro mandato.

Dois anos depois estourou o mensalão, em que há crimes de lavagem de dinheiro e também de desvio de recursos públicos, entre outros.
Silêncio total.


E assim tem sido até agora, na sucessão de escândalos nestes quase sete meses de governo Dilma. Sequer apoio à presidente, petista, é dado.

Forja-se, agora, uma curiosa desculpa para essa imobilização: tudo seria fruto do "udenismo" da oposição e, claro, da imprensa independente e profissional. Quer-se, com isso, importar das décadas de 50 e 60 uma luta ideológica entre a UDN de Carlos Lacerda e o PTB de Getúlio, Jango e Brizola, um anacronismo.

Além de se considerar que havia mesmo corrupção no Palácio do Catete daqueles tempos, hoje a conjuntura é muito diferente. Não há qualquer campanha ideológica orquestrada contra qualquer governo, apenas -- o que não é pouco -- fatos concretos, substantivos, de malfeitos na esfera do poder.

O mensalão, de tão substantivo, virou peça de acusação do Ministério Público Federal aceita pelo Supremo, que se prepara para julgar o histórico processo em 2012, salvo chicanas advocatícias.

Nele estão figuras estreladas do PT, como José Dirceu, Genoino, o tesoureiro Delúbio Soares - recebido de volta pelo partido sem pudores -, João Paulo Cunha etc.


Talvez isto iniba a UNE, sindicatos e movimentos ditos sociais, também dependentes de verbas públicas. Fica evidente que, na ótica de algumas organizações, há corrupções e corrupções.

Se o escândalo envolve o governo Collor de Mello, a postura é uma; caso atinja o PT, o silêncio impera. (Não se deve mesmo esquecer que existe um mensalão tucano mineiro no Supremo, à frente dele o ex-governador Eduardo Azeredo).


Não há como ressuscitar no século XXI os embates ideológicos do início da metade do século passado. Não está em questão a tomada do poder, mas a lisura no manejo do dinheiro do contribuinte, o que não pode ser considerado desimportante.

Mas, em nome da manutenção do poder, faz-se vista grossa a escabrosos assaltos ao Tesouro, cometidos à vista de todos.


Há o perigo de UNE, MST e entidades sindicais reeditarem algo também tão carcomido quanto o embate de "udenismo" versus "trabalhismo/getulismo":
o "rouba mas faz" do populismo de Adhemar de Barros da política paulista daqueles mesmos tempos. Uma ideologia distorcida que se manteve na vida pública de São Paulo até Paulo Maluf.


Recoloca-se a também antiga questão dos "fins que justificam os meios", cacoete de movimentos de esquerda que terminou desaguando no mensalão e em outras impropriedades em certas empresas estatais.

O fato de a UNE fazer um congresso patrocinado pelo dinheiro público é apenas um aspecto, seja uma caneta petista ou tucana que libere as verbas. Há mesmo eventos de organizações da sociedade que precisam e devem contar com apoio do poder público.


O ponto é outro:
o que UNE, sindicatos, MST e similares dão em troca do acesso ao dinheiro do contribuinte. O silêncio diante da enxurrada de casos de desvio de dinheiro do Tesouro é grave. Inevitável que se faça ligação entre uma coisa e outra.


Há - ou deveria haver - preceitos éticos que pairam sobre partidos e ideologias, bem como o compromisso inegociável com eles. Se não, a vida pública se resume a um vale-tudo de quinta categoria, sem aprimorar a sociedade.

O Globo

DIRETO PARA O ESPLANADA : UNE DO GOVERNO, UNE NO PODER.

Ligados ao PCdoB, maioria dos ex-dirigentes da União Nacional dos Estudantes ocupa hoje cargos no Ministério do Esporte

Desde que Orlando Silva presidiu a entidade estudantil, na década de 1990, os demais comandantes da instituição não ficaram desempregados após o término de seus mandatos. A maioria ganhou vaga no Ministério do Esporte

Se confirmada a tendência verificada desde meados da década de 1990, Daniel Iliescu, 26 anos, o novo presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), não precisa se preocupar com o futuro profissional, mesmo que não termine a faculdade.

Os seus antecessores eram, como ele, filiados ao PCdoB e garantiram bons empregos no governo — a maioria no Ministério do Esporte — após o término do mandato de dois anos na entidade estudantil, incluindo aqueles que abandonaram os estudos.


Desde 1995, quando o ministro do Esporte, Orlando Silva, foi eleito presidente da UNE, a maioria dos estudantes que o sucederam na entidade passou a ocupar um cargo público, por indicação política. Quase todos, ligados ao esporte (veja quadro).

Ricardo Capelli, que presidiu a instituição entre 1997 e 1999, após Orlando Silva, dirigiu o Departamento de Esporte Universitário do ministério, em 2003. Hoje, é presidente da Comissão da Lei de Incentivo ao Esporte da pasta. Wadson Ribeiro, secretário nacional de Esporte Educacional do ministério, foi presidente da entidade entre 1999 e 2001.

Ele cursou três anos de medicina na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG), mas não concluiu os estudos. Ele acredita que sua presença na Esplanada se deve mais pela trajetória política do que pelos conhecimentos adquiridos na faculdade.


Felipe Maia é uma das exceções: em vez do Ministério do Esporte, ocupou o cargo de ouvidor-geral da Agência Nacional de Cinema (Ancine). Gustavo Petta é o último ex-presidente da UNE a ocupar um cargo relacionado ao esporte.
Sua irmã, Ana Cristina Petta, é casada com o ministro Orlando Silva.

À frente da entidade estudantil entre 2003 e 2007, foi convidado, em 2009, para ser secretário do Esporte de Campinas (SP).


Mostrando sua influência no governo, no ano passado, Petta foi convidado por Orlando Silva e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a organização da 3ª Conferência Nacional de Esporte, em Brasília.

Este ano, Campinas foi a cidade escolhida para abrigar o centro esportivo Rede Nacional de Treinamento, com um investimento de R$ 15,2 milhões.


Continuidade
Daniel Iliescu, que dá continuidade à hegemonia de 16 anos do PCdoB à frente da UNE, diz que "não saberia explicar esse acúmulo de ex-presidentes (da entidade) no ministério", e afirma ser uma "escolha pessoal, que não diz mais respeito à UNE, porque essas pessoas não são mais da instituição". O novo comandante da entidade afirma não ter pretensões de ocupar um cargo na pasta do Esporte.

"Talvez isso sirva para tranquilizar as pessoas que achem que esse seja o caminho natural para ex-presidentes da UNE", afirma. Iliescu, no entanto, não descarta a possibilidade de se dedicar à vida pública.


Iliescu sinaliza que há outras diferenças entre suas percepções políticas e as de seus antecessores. O tratamento que pretende dar à prestação de contas dos repasses que a entidade recebe do governo federal é uma delas. Entre 2003 e 2009, foram mais de R$ 13,7 milhões recebidos para a realização de eventos em todo o Brasil.

Além desse valor, a UNE recebeu mais R$ 30 milhões, em 2010, a título de indenização pela sede da entidade, desapropriada em 1964. Com esses recursos, a entidade vai construir sua nova sede, na Praia do Flamengo, projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer.


O Correio questionou o Ministério do Esporte sobre o motivo de ex-dirigentes da UNE, filiados ao PCdoB, estarem agora ocupando cargos na pasta. A assessoria de imprensa do ministro Orlando Silva afirmou que, como em qualquer ministério, há quadros políticos e quadros técnicos e que o ministro escolhe para trabalhar ao seu lado pessoas nas quais confia.

Júnia Gama Correio Braziliense